A nova manobra do Centrão para ampliar seu poder sobre o Orçamento

Parlamentares articulam a derrubada de veto à proposta que permite pagamento de emendas antes do início de obras e sem análise de projetos; mudança tem aval da Caixa, controlada pelo PP

POR WENDAL CARMO

Caciques do Centrão querem aproveitar a insatisfação dos congressistas com o corte de Lula (PT) em parte do montante destinado às emendas de comissão em 2024 para ampliar o poder sobre o Orçamento da União às vésperas das eleições municipais, segundo relatos feitos a CartaCapital.

A articulação tem como pano de fundo a derrubada de um veto presidencial ao trecho que permite o envio dos recursos federais de forma mais rápida e menos transparente aos estados e municípios. O texto barrado pelo petista na sanção da peça orçamentária é de autoria do senador Marcelo Castro (MDB) e foi aprovado em votação-relâmpago.

Na prática, a proposta impacta diretamente quase a totalidade dos repasses feitos por meio de convênios e contratos da União com prefeituras, governos estaduais e empresas privadas. Parlamentares afirmam, sob reserva, que a mudança conta com o aval da Caixa, comandada pelo grupo político de Arthur Lira (PP).

Funcionaria assim: se o projeto custar até 1,5 milhão de reais, o dinheiro pode cair na conta da prefeitura de uma só vez, antes do início dos serviços. Geralmente, essas verbas são indicadas para custear obras de infraestrutura e reformas de prédios públicos, mas acabou sendo aplicadas na compra de tratores, por exemplo.

Pelo modelo em vigor, o pagamento deve ser feito em parcelas e depende do andamento da obra – que, apesar de garantir maior controle sobre a aplicação dos recursos, era alvo de reclamações dos políticos pela demora na conclusão das obras.

Os documentos exigidos por órgãos de controle como Tribunal de Contas da União ainda serão obrigatórios, mas podem ser apresentados ao término dos serviços, algo criticado por especialistas em transparência.

Na avaliação dos congressistas, a mudança vai acelerar o pagamento das emendas e a conclusão das mais de 8 mil obras incompletas. Ocorre que, argumentam técnicos do TCU, a paralisia está relacionada às falhas técnicas dos projetos, justamente o ponto que a proposta do Congresso deixa sem análise prévia.

Toda essa articulação tem como pano de fundo as eleições municipais, previstas para outubro. Isso porque os congressistas desejam acelerar o envio das verbas porque a lei eleitoral proíbe o repasse nos três meses anteriores ao pleito.

Ao vetar o trecho que trata do tema, Lula disse considerar que o modelo “desprestigia o planejamento”, desvirtua o processo orçamentário e fere o princípio da moralidade administrativa. Consultada pelo Planalto, a Controladoria-Geral da União também afirmou que a proposta é inconstitucional e defendeu seu veto.

“Os efeitos gerados [pelo modelo] é a lentidão na entrega de políticas públicas para a sociedade, pois é inevitável afastar as falhas durante a execução dos convênios e contratos de repasse que não são devidamente planejados”, escreveu o órgão.

O entendimento, segundo líderes partidários, é que o trecho que trata do “regime simplificado de transferências voluntárias” deve ser retomado durante a sessão conjunta do Congresso Nacional, prevista para a primeira semana de fevereiro.

A derrubada dos vetos é defendida por parlamentares que desejam “dar um recado” ao governo. Isso porque, ao sancionar o Orçamento deste ano, Lula também barrou dois dispositivos que, na prática, ampliava o poder do Centrão: o calendário de pagamento de emendas e o aumento de 5,6 bilhões no total destinado às emendas de comissão.

Uma reunião com os líderes partidários foi convocada para a próxima segunda-feira. Até lá, interlocutores do Planalto estão em campo para tentar esfriar os ânimos e encontrar uma saída pacífica à irritação, na tentativa de evitar que o desgaste se amplie.

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