O desembargador Marcos José de Brito Rodrigues, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, é investigado pela “venda de sentença” no caso de dois imóveis avaliados em R$ 5,830 milhões. Ele teria recebido valor equivalente a “arrobas” para dar a posse das propriedades para os compradores, apesar de terem pago apenas 35% do valor combinado.
Conforme a Polícia Federal, a negociação entre o magistrado, identificado como “Gordo”, e Lauro Henrique Fenner e Paulo Ricardo Fenner, ocorreu por meio do advogado Félix Jayme Nunes da Cunha. Em uma das conversas, ele pressiona os empresários a efetuar logo o depósito porque estaria sendo cobrado pelo magistrado.
As revelações fazem parte do despacho do ministro Francisco Falcão, relator da Operação Ultima Ratio no Superior Tribunal de Justiça, deflagrada na última quinta-feira (24). Brito foi um dos cinco desembargadores afastados do cargo e obrigados a colocar tornozeleira eletrônica.
Em junho de 2015, há mais de nove anos, José Bento Sobrinho vendeu a Fazenda Montanha e a Estância San Diego por R$ 5,830 milhões para Lauro Fenner. Paulo Ricardo entrou no negócio como avalista. Contudo, ele só pagou R$ 2,050 milhões. As propriedades rurais foram arrendadas por Fenner para cultivo de soja e criação de gado.
Em sentença, a juíza Mariel Cavalin dos Santos, da 16ª Vara Cível de Campo Grande, julgou o pedido parcialmente procedente e determinou a rescisão do contrato e a restituição dos valores pagos.
Tribunal muda sentença
Conforme a PF, mesmo não sendo parte no processo, Félix Jayme negociou a venda de sentença entre Marcos José de Brito Rodrigues e os dois empresários. A 1ª Câmara Cível do TJMS acatou pedido dos empresários e reformou a sentença, dando o ganho da causa para Lauro e Paulo Fenner.
O julgamento no tribunal ocorreu no dia 2 de abril de 2019. Brito foi o relator. “Nos referidos autos 0820562-62.2015.8.12.0001, tendo MARCOS BRITO como relator no qual, por unanimidade, foi dado provimento ao recurso de LAURO FENNER e PAULO FENNER, desconstituindo a sentença de primeiro grau. Também participaram do julgamento os desembargadores MARCELO RASSLAN e JOÃO MARIA LÓS. Conforme será verificado abaixo, embora na época FELIX não constasse como advogado de PAULO FENNER no processo, era ele quem atuava de fato”, relatou a PF.
Logo após a decisão, Cunha cobra o empresário o pagamento do valor combinado com o desembargador, conforme a PF. ““Dia meu amigo Paulo. Paulo, que horas você vai depositar o do Gordo ai, já tá me ligando aqui. Não fura hoje não hem Paulo. Um abraço meu amigo”, escreveu o advogado em mensagem enviada pelo WhatsApp.
O advogado acaba passando R$ 15 mil para o desembargado pra quitar parte do acordo, conforme trecho de outra conversa. O ministro Francisco Falcão destacou ainda que o magistrado “ficou macio” após receber um valor acima do esperado.
“Portanto, segundo a mensagem acima, FELIX efetuou o pagamento de R$ 15 mil a GORDO em 09/04/2019. FELIX complementa que: ‘Ficou macio. Lembrei ele que é nove arribas cada e que 15 passou de 10 cabeças. Ficou joia. Ele tava achando que dava 1.500 por vaca lkkk’. Nesse trecho, aparentemente FELIX está dizendo que o valor combinado com GORDO era o equivalente a 9 arrobas/cabeças, e R$ 15 mil ultrapassa 10, pois cada uma corresponde a R$ 1.500,00, e por isso GORDO ficou satisfeito (‘macio’), ou seja, pagaram a GORDO mais que o combinado. No mesmo dia 10/04/2019, FELIX envia mensagem a PAULO FENNER na qual, a nosso ver, demonstra que GORDO é um desembargador, pois diz que se o juiz negar (se referindo a outro processo), vão recorrer e vai parar na mão do GORDO”, destacou o ministro, sobre o relatório da PF.
“Apresenta, ainda, os registros de diversos saques em espécie efetuados por FELIX JAYME NUNES DA CUNHA, entre os dias 08/04/2019 e 12/04/2019, bem como o registro de ligações entre o advogado e o Desembargador MARCOS BRITO”, pontua.
O escândalo é um dos maiores da história do Tribunal de Justiça. Marcos José de Brito Rodrigues ingressou na magistratura há 36 anos e foi promovido a desembargador há 12 anos.